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Valeu, Marta! Você é o verdadeiro milagre do futebol

Gabriela Tunes


Foi triste. Não era assim que a gente queria que a maior do mundo de todos os tempos se despedisse da Copa do Mundo, em um jogo morno, sem graça, em um fracasso retumbante da seleção feminina de futebol. A campanha do Brasil nessa Copa do Mundo foi pífia. A seleção se iludiu com o Panamá, se resignou com a França e se lascou com a Jamaica. Perdeu jogando muito mal, errando passes, sem criar nada, não conseguindo romper uma retranca montada por uma seleção que não tinha um time, uma seleção de uma jogadora só, com as demais exercendo a função de arrastar o jogo até o fim sem levar gols. Elas conseguiram, mas, provavelmente, não irão muito à frente na Copa do Mundo. Elas fizeram o seu melhor, afinal, foram para a copa com dinheiro de vaquinha online e com ajuda da família do Bob Marley, ou seja, em um esquema totalmente amador.


Da seleção brasileira, esperávamos mais. Não porque houve apoio e investimento (que é o mínimo a se oferecer a uma Seleção Brasileira, seja ela boa ou ruim), mas porque há talento e qualidade nas jogadoras individualmente. Mas falta muita coisa ainda. Nas entrevistas do pós-jogo, as jogadoras não conseguiram falar do jogo; apenas repetiam que é preciso manter a estrutura e o investimento. A Antônia não soube explicar o que faltou ao Brasil para conseguir vencer uma seleção tão pior do que a nossa.


Que o futebol feminino é militância, sabemos que sim, que, pela história do futebol feminino, é necessário que seja assim, e ainda o será por muito tempo. Mas é preciso trata-lo como Esporte Nacional também. É preciso entrar no jogo com foco na vitória, entrar para ganhar, levar a sério a bola rolando e os noventa minutos de jogo. E, se formos levar esse Esporte a sério, a Pia tem que rodar. Ela ficou quatro anos, teve tempo de fazer um trabalho, foi respeitada em sua condição de técnica, mas não apresentou bons resultados. Essa cobrança é natural, apesar de tudo o que empecilha o desenvolvimento do futebol feminino. Temos consciência que é delicado realizar cobranças altas em um esporte que foi criminalizado por décadas, mas o fazemos porque sabemos que dá pé. O Brasil tem grandes jogadoras e precisa organizar melhor as campanhas de sua seleção. Para isso, obviamente, toda uma cadeia deve ser fortalecida.


E aí temos que a grande estratégia do futebol feminino está sendo traçada fora do campo, por ela, sim, outra grande jogadora, porém de vôlei, a Ministra Ana Moser, que já entregou um Decreto com uma Estratégia Nacional para o Futebol Feminino. É o mínimo de reparação histórica que esse Esporte necessita receber do Estado que o criminalizou por décadas. É preciso estruturar o Campeonato Brasileiro de Futebol. Não tem como esperar uma seleção campeã em um país onde um time da Série A coloca meninas de quatorze anos para jogar no profissional, tendo elas levado uma goleada vergonhosa, e as próprias adversárias chamarem a atenção da direção do time que fez isso; ou que um jogo não aconteça porque a bolsa com o uniforme do time foi roubada; ou porque um jogo não aconteça porque o campo onde iria rolar foi subitamente requisitado para um time masculino treinar.


Além do Campeonato Brasileiro, é preciso fortalecer os campeonatos de base do futebol feminino, e isso tudo a Estratégia Nacional poderá impulsionar. Quanto à seleção brasileira, precisa pensar mais no jogo e menos na militância, menos na visibilidade, menos no que falta ao futebol feminino. Então, claro, é fundamental que não falte nada. Isso, a Política e a militância têm que garantir. A militância é conosco. Com as jogadoras, deixemos apenas o jogo, o foco na bola.

Mas a Marta foi a melhor do mundo e não teve nem estrutura, nem apoio, nem suporte. Sim, porque a Marta é a Marta, apesar de ser brasileira jogadora de futebol. Ela é gigante por isso também, porque conseguiu um milagre, de ser a melhor do mundo fazendo uma coisa que, poucos anos atrás, a colocaria atrás das grades. É muita barreira social e cultural que ela venceu (e que todas as jogadoras ainda enfrentam diariamente). Por isso, ela é a maior de todos os tempos. Faltou essa estrela, faltou esse título, faltou vencer a Copa, mas isso não a diminui. Por ela, só por ela, o Brasil merecia essa Copa. Se o Pelé é o Rei do Futebol, a Marta é bem mais do que Rainha. Mesmo Pelé tendo vencido três copas, Marta não é menor do que ele. A Marta é um milagre, a maior de todas e todos desse país do futebol. O tempo dirá. À minha eterna camisa 10, minha total reverência. Valeu, Marta! Você é o verdadeiro milagre do futebol. ____________

Gabriela Tunes é autora de "Máscaras no Varal" (Terra Redonda, 2022) e do conto "A quarentena reversa", na coletânea "Contos da Quarentena" (Terra Redonda, 2020).


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