O catarinense Caléu Nilson Moraes (autor de Declínio e Queda de Mim Mesmo, da Terra Redonda) compartilha aqui algumas das leituras que ajudaram a moldá-lo como leitor e como escritor.
São obras que apresentam uma variedade de temas e passeiam por diferentes países. Este texto foi publicado originalmente no site do Sesc-PR.
Leia abaixo as cinco indicações literárias de Caléu Nilson Moraes
O massagista místico – V. S. Naipaul
Trata-se dum livro cáustico, debochado e incrivelmente leve que releio sazonalmente. V. S. Naipaul, o polêmico autor nascido em Trinidad e Tobago, desnuda as crenças e tolices da sua gente na história cômica de Ganesh, místico e falso erudito, cujos inícios modestos não o impediram de chegar, apoiado na crendice popular, na ignorância dos seus e na sua própria, ao alto escalão do governo. O livro é um prodígio da escrita econômica. Sem o peso de toneladas de adjetivos, suas poucas páginas garantem uma leitura fluida e instigante.
O filho chinês de Deus – Jonathan Spence
Tenho certo prazer na leitura de obras que ilustram nossa estupidez. Por isso, para além de literatura propriamente, aprecio livros de história cultural como os de Jonathan Spence. Neste O filho chinês de Deus, descobrimos a história dum palerma reprovado nos exames imperiais que depois duma longa doença perdeu o juízo e, pelo contato com missionários europeus, resolveu afirmar ser o irmão de Jesus Cristo. Levou à morte milhares de chineses numa longa revolta contra o império. O livro é delicioso. A precisão do historiador e paspalhice dos seus personagens são alimento para um leitor voraz. Para além disso, Jonathan Spence é um virtuose na arte de contar histórias.
A vida e as opiniões de Tristram Shandy – Laurence Sterne
Há livros dos quais não abrimos mão; este é um deles. Meu exemplar do Tristram Shandy é frequentemente manuseado. Apesar da ironia, da jocosidade e dos frequentes expedientes cômicos, este livro é uma profunda meditação sobre a morte e sobre a desrazão da nossa existência. Gosto do vaivém da história interminável, cíclica e bagunçada; as anedotas do Tio Toby não têm par. É, em suma, um livro sábio (tenho em mente um adágio chinês: um sábio não tem ideias). Trata-se dum guia longo (não longo o bastante) para que saibamos o que fazer (nada) com a incessante dor de estarmos vivos.
A luta – Normal Mailer
É um livro-reportagem que descreve a luta de Muhammad Ali contra George Foreman no Zaire, em 1974. Para além do embate dos grandes boxeadores, o texto é retrato das tensões políticas que percorreram os anos 70. Mailer é, muitas vezes, engraçado. A prosa é simplicíssima e encantadora; todo mundo é, neste livro, palerma e detestável. Divirto-me pra caramba quando o leio. Gostaria de escrever assim.
Jovens de um novo tempo, despertai! – Kenzaburo Oe
Não vou resumir as aventuras do narrador e do seu filho idiota; isto tem a ver, claro, com o enredo do livro. O que me importa, porém, neste livro fabuloso é a técnica narrativa do autor: mergulhar na poesia de William Blake para contar a história do seu filho descapacitado, exercendo um tipo de crítica literária criativa. Os livros de Oe são como catábases; há quem veja alguma esperança em suas obras. De minha parte, só percebo o desalento… A reflexões sobre a literatura são o que há de mais iluminado na obra deste grande autor japonês que, de longe, está entre os meus autores favoritos.
Sobre Caléu Nilson Moraes
Caléu Nilson Moraes, catarinense, é escritor e professor da rede pública estadual. Venceu o concurso de Contos Silveira de Souza da Universidade Federal de Santa Catarina e publicou Guia literário para machos. Graduado em História, fez mestrado em Antropologia Social e doutorado em Estudos da Tradução. É autor dos seguintes romances: Declínio e queda de mim mesmo (à venda no site da Terra Redonda), A morte do alquimista e As aventuras de Lorde Nélson, ambos no prelo.
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