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Crônica para Juliana

Juliana Carvalho Lopes conviveu por quatro anos com o câncer até nos deixar, neste

4/3/2023. Generosa e agregadora, antes de partir ela nos ensinou que o amor tem muitas formas de ser vivido


Carolina Avansini, no portal Firminas


Prólogo: Está crônica foi escrita para minha amiga Juliana logo após

a segunda-feira do Carnaval de 2023, quando generosamente ofereceu

aos amigos a oportunidade de estar com ela em uma última festa


Juliana em janeiro de 2023, linda e plena

Vamos passar o Ano Novo na festa da Juliana?

Eu não estava muito acostumada a encontrar outras meninas nesse rolê, de modos que achei legal. A Cynthia, minha dupla de todas as empreitadas, topou ficar em Londrina e decidimos ir para a tal festa, junto com o Cibié.


Não lembro em detalhes sobre como foi combinado e nem mesmo o local exato onde aconteceu o festerê. Mas chegamos a uma casa bem no estilo dos anos 1980, ali no Centro, e Juliana veio nos receber.


A Juliana, no caso, era uma adolescente de 15 ou 16 anos, muito dona de si, que nos convidou para entrar e explicou tudo que a gente precisava saber: tem cerveja aqui e para comer temos “carne louca”.


Julianinha aos 15 anos, já defendendo com garra as suas ideias

Claro que eu amei Juliana logo de cara. Ali na década de 1990 a gente ainda estava tateando no feminismo, o movimento riot grrrl dava sinais de que não havia mais espaço para rivalidade feminina e que as mulheres do “movimento” precisavam se apoiar. Mas não pensei em nada disso diante daquela adolescente ousada. Eu amei Juliana, sobretudo, porque ela foi acolhedora e nos lembrou que tinha comida. A “carne louca”, aliás, era uma iguaria que eu não conhecia por esse nome e que se tornou um clássico em todas as outras festas da Ju.


Corta para o ano de 2002. Eu tinha acabado de ter minha primeira filha, Cecília, e me sentia muito sozinha e desamparada. A sensação é que eu tinha saído diretamente de um buraco negro das noites de Londrina para um universo de fraldas, leite e privação de sono que parecia não ter fim. E aí, mais uma vez, veio um convite da Ju: uma festa no buffet da família dela, só para os amigos.


Nesta época, a Ju e o Márcio também tinham uma filha pequena, a Gabi. E garantiram: pode trazer a bebê, vai ser tranquilo. Acho que nunca tive oportunidade de contar isso para os dois, mas foi a primeira festa da vida da Ceci. E foi a primeira vez que tivemos coragem de sair com ela à noite para um ambiente mais “animado”.


Não foi divertido para mim, que amamentava e me sentia muito esgotada com um bebê de quatro meses, mas foi um marco importante. Juliana, mais uma vez, me mostrou que a vida é para ser vivida e a gente tem que se adaptar a ela. E daquele dia em diante eu entendi que ter uma filha não devia ser um empecilho para me divertir.


Meu grupo de amigos nunca teve muitas mães de adolescentes. A galera demorou um pouco mais para ter filhos, de modo que, toda vez que eu encontro a Ju, esse assunto vem à tona (muito embora nossas filhas mais velhas já sejam oficialmente adultas).

E aí, em um dia despretensioso em que a gente tomava chope no shopping Quintino (lugar estranho, mas saibam que eu já tomei chope com a Ju em muitos lugares nesta vida), Juliana me deu um conselho de ouro: Carol, não deixe suas filhas decidirem sobre o que você pode fazer.


Eu reclamava para ela que as meninas tentavam se intrometer nos meus programas, não queriam que eu saísse para tomar um chope com os amigos, etc, etc. E aí eu mesma complementei aquele conselho: é mais fácil um filho ser feliz quando a mãe é feliz. Ou pelo menos permite que haja diversão em sua vida.


Mais de uma década depois da primeira festa depois que me tornei mãe: Juliana, Carol e Ceci celebrando o aniversário da Ju

Essas histórias todas saíram das profundezas da minha memória na segunda-feira (23/02/2023). A Ju fez uma festa linda de Carnaval, a Folia da Ju, um momento especial que só expôs, mais uma vez, a generosidade dela diante da vida. Eu cheguei com fome, confesso, e logo fui me servir para não tomar chope de estômago vazio. E vocês adivinham o que tinha no cardápio? Ela mesma, a carne louca!


Na mesma hora me transportei para aquela casa de varanda grande, possivelmente na Vila Nova, onde a Julianinha me recebeu sorrindo com cerveja e sanduíche de carne. Quis contar essa história para ela lá na festa, mas aí lembrei que a gente tem outra coisa em comum: amamos escrever. Decidi, então, que escreveria uma carta, mas depois pensei que uma crônica combina mais comigo, o que não me impede de encerrar o texto no melhor estilo da comunicação interpessoal:


Obrigada, Ju, por me apresentar a carne louca e me lembrar sempre que a vida é boa.


Com amor, Carol.


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Carolina Avansini é jornalista e faz parte da Infinita Escrita Afetiva - Agência de Conteúdo. Casada com o Cibié, é mãe da Ceci e da Clari.

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Com a publicação desta crônica, a Terra Redonda homenageia a pessoa iluminada que foi Juliana Carvalho Lopes. Nosso editor, Sergio Alli, conviveu uns poucos dias com ela, em 2012, suficientes para conhecer seu inesquecível sorriso. Ele teve, ao longo da vida, o privilégio de trabalhar com a mãe de Juliana, Márcia, e com seu tio, Gilberto, e mantém por eles laços profundos de carinho e admiração.


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